A Associação Brasileira de Avaliação de Impacto (ABAI) entende que a tragédia de Brumadinho/MG não pode ser interpretada como fato isolado ou caso fortuito, mas sim como produto de uma desvalorização sistemática da agenda ambiental em todos os níveis de governo. Frente ao desmonte que as Instituições e Agências do setor Ambiental estão sofrendo, a manifestação dos setores preocupados com os valores sociais e ambientais não pode ser de contemporização, admitindo que a tragédia de Brumadinho seja um desastre e não um crime, ou apenas de demonstração de tristeza pelos fatos associados à tragédia. Claro que existe uma consternação e enorme pesar pelo expressivo número de vidas ceifadas e pelo incomensurável desastre e perdas materiais e ambientais provocados. Contudo, são necessárias ações imediatas e intransigentes para que os valores ambientais e sociais, presentes na Constituição Brasileira e inúmeras normas do país, sejam resgatados.

A atual tragédia da barragem de rejeito da empresa VALE em Brumadinho reflete uma postura política de enfraquecimento das Agências Ambientais e de desmantelamento das instituições. O licenciamento ambiental é um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente que requer técnica, treinamento e capacitação para ser executado, além da imprescindível participação da sociedade nos processos de decisão e gestão. Não pode continuar a ser tratado como um entrave ao desenvolvimento e objeto de barganha e pressão do setor econômico, pois acarreta em grandes perdas ambientais e para toda a sociedade brasileira.

Portanto, não será simplificando os seus procedimentos, considerando certas atividades de baixo impacto, ou de baixo risco, à mercê dos compromissos político-econômicos ajustados pré e pós eleições, que os problemas serão resolvidos. Sendo assim, é inadmissível que mesmo após a tragédia ocorrida em Mariana em 2015 haja uma reincidência dessa magnitude. A repetição do roteiro em pouco mais de 3 anos indica que o problema é crônico e sistêmico – e não cabem somente explicações conjunturais sem punições aos responsáveis.

As associações técnicas e a sociedade civil devem participar como protagonistas deste processo de discussão e elaboração de eventuais ajustes nos procedimentos de avaliação de impacto ambiental, de licenciamento ambiental, de áreas especialmente protegidas, da gestão e gerenciamento e outros instrumentos da Política Ambiental. A ABAI está pronta e disposta para participar ativamente deste processo, como integrante da sociedade civil e técnica.

A impunidade que impera aos infratores e aos que cometem os crimes ambientais agrava a situação do descaso na área ambiental. A aplicação de multas é absolutamente insuficiente para posicionar os valores ambientais. O Brasil tem uma legislação que não é aplicada adequadamente, pois as situações de invasão de Unidades de Conservação e áreas protegidas, o descarte de resíduos e rejeitos em água ou terras sem o devido tratamento e as tragédias provocadas pelo setor de mineração estão tipificados na Lei Federal 9.605 de 1998, que fará 21 anos no dia 12 de fevereiro próximo, devendo os autores, coautores ou partícipes do fato, sejam pessoas físicas ou jurídicas, responsabilizadas criminalmente. Adicionalmente, a lei Federal 6.938 de 1981 expressa que o agente causador de danos ambientais e a terceiros é obrigado a indenizar e reparar esses danos independentemente da existência de culpa, isto é, sem que seja necessário demonstrar imperícia, imprudência ou negligência. Basta a existência do nexo causal entre o ato e o dano. Portanto, o Brasil dispõe de legislação exemplar para a área ambiental para estes casos e precisa ser aplicada.

Assim, a ABAI entende que o Ministério Público Federal e do Estado de Minas Gerais devem agir de maneira imediata, investigando e propondo punição de todos que tenham contribuído com esta tragédia; e que o Poder Judiciário, em suas diversas instâncias, possa responder celeremente à sociedade e que todos sejam estimulados a adotarem posições mais responsáveis do ponto de vista social e ambiental.

Por fim, a ABAI entende que os segmentos da sociedade preocupados com os valores sociais e ambientais devem cobrar ações mais responsáveis dos Governos Federal, Estaduais e Municipais em relação à Política Ambiental e ao desmantelamento dos Órgãos Ambientais, notadamente no tocante à absurda flexibilização da Avaliação de Impacto Ambiental e Licenciamento Ambiental e ao desmonte e abandono dos Órgãos Ambientais, do seu corpo técnico, dos equipamentos e da infraestrutura. O tempo é de ação e de fortalecimento da sociedade e seus valores sociais e ambientais.

 

Associação Brasileira de Avaliação de Impacto – ABAI
Texto elaborado por associados e diretoria da ABAI

 

Para contato:

Marcelo Marini Pereira de Souza – Presidente

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